Algum dia, talvez, será uma alegria recordar mesmo essas coisas
Virgílio, Eneida, 1.217


Em 2008 eu estava num curso de teatro e me foi pedido que levasse um “objeto de alegria”. Algo que fosse muito significativo. Eu levei então uma caixa velha de sapatos cheia de papel dentro. A indicação era que cada um fosse lá na frente e contasse em dois minutos cronometrados, a história desse objeto, o porquê desse objeto ser o seu objeto de alegria. “Isso é uma caixa velha de sapatos e aqui dentro tem um monte de papeizinhos, bilhetes, todos escritos com frases do meu pai que há alguns anos deixou de falar. Mas aí eu pensei comigo “as pessoas não devem estar entendendo porque isso é um objeto de “alegria”. Então eu contei que meu pai foi embora de casa quando eu era adolescente e isso foi um alívio. Mas alguns anos depois, em função da doença que fez ele parar de falar, a gente se reaproximou. E essa caixa é meu objeto de alegria porque ela contém todas as conversas que eu nunca tinha tido com meu pai no tempo em que ele podia falar.” Mas a premissa do exercício era falar até que o tempo se esgotasse e não tendo mais nada pra dizer sobre a história, num susto, meio de brincadeira, eu falei: “E eu vou escrever, dirigir e atuar num curta metragem chamado Conversas com meu pai”. O cronômetro soou e de lá pra cá já foram quase sete anos de processo.

Janaina Leite